(DOC. VP 276.1708.6554.1190) - ÍNTEGRA LIBERADA PARA DEMONSTRAÇÃO
TJRS. APELAÇÃO CRIMINAL. RECURSOS MINISTERIAL E DEFENSIVO. TRÁFICO DE DROGAS. REDIMENSIONAMENTO DA PENA-BASE. AFASTAMENTO DO VETOR «CONSEQUÊNCIAS". RECONHECIMENTO DA CAUSA ESPECIAL DE DIMINUIÇÃO DE PENA PREVISTA NO Lei 11.343/2006, art. 33, §4º. NÃO CABIMENTO. DEDICAÇÃO ÀS ATIVIDADES CRIMINOSAS EVIDENCIADA NOS AUTOS. REQUISITOS LEGAIS NÃO PREENCHIDOS. PRIVILÉGIO AFASTADO. Tanto a defesa quanto a acusação não questionam a materialidade ou autoria delitivas, uma vez que ambas se insurgem apenas quanto à dosimetria da pena imposta ao denunciado. O Ministério Público pugna pelo afastamento da causa de diminuição disposta no Lei 11.343/2006, art. 33, §4º, sob o argumento de que o réu não preenche os requisitos para tanto, com razão. Como é cediço, consoante entendimento consolidado nesta Corte, a incidência do redutor de pena previsto no § 4º, da Lei 11.343/06, art. 33 (de um sexto a dois terços), usualmente aplicado aos traficantes de primeira viagem ou de baixa periculosidade, depende da identificação de quatro requisitos cumulativos descritos no texto legal, quais sejam: a) primariedade, b) bons antecedentes, c) não dedicação às atividades criminosas, d) não integração à organização criminosa. Vale lembrar, nessa linha, que este Tribunal tem entendimento sedimentado no sentido de que, quando as provas constantes dos autos evidenciam a dedicação do acusado às atividades criminosas, devidamente fundamentado é o afastamento da causa de diminuição prevista na Lei 11.343/06, art. 33, § 4º. Com a devida vênia, embora primário e, ao que se sabe, não integrante de organização criminosa, o acusado praticava o ilícito de forma habitual, circunstância que não permite a aplicação da benesse. Tal conclusão é facilmente obtida diante da natureza, quantidade e variedade de narcóticos apreendidos em sua residência, consistente em «01 (um) pé de maconha; (b) 2 (dois) pacotes de maconha tipo «camarão», pesando, aproximadamente, 80 (oitenta) gramas; (c) 1 (um) saco de maconha, pesando, aproximadamente, 20 (vinte) gramas; (d) 1 (um) frasco contendo um quinto do volume total com Cetamin; (e) 1 (um) tijolo de maconha, pesando, aproximadamente, 200 (duzentos) gramas; (f) 1 (uma) porção de cocaína, pesando, aproximadamente, 28 (vinte e oito) gramas; (g) 1 (um) pacote de ecstasy, pesando, aproximadamente, 50 (cinquenta) gramas; (h) 1 (um) pacote de haxixe, pesando, aproximadamente, 5 (cinco) gramas; (i) 1 (uma) pedra de haxixe, pesando, aproximadamente, 6 (seis) gramas; e (j) 6 (seis) cápsulas de Special Key», além da apreensão de apetrechos utilizados no preparo e fracionamento dos entorpecentes, tais como lâminas, seringas e ziplocks. Além do mais, a prisão em flagrante do acusado originou-se de investigação denominada «Operação Desvio de Rota», onde restou apurada a participação do denunciado em um sistema de tele-entrega de drogas na Região do Vale dos Sinos, em que uma pessoa possuía um catálogo de drogas na rede social e os usuários realizavam pedidos por ali, recebendo a droga em casa. Logo, ficou claro não se tratar de fato único, não merecendo, por isso, ser agraciado com a benesse da Lei 11.343/2006, art. 33, § 4º, que deve ser concedida apenas àquele que se valeu do comércio ilegal de forma isolada em sua vida. Destarte, o afastamento da benesse é medida impositiva. Em relação ao pedido defensivo de abrandamento da pena-base, a Togada exasperou a pena em razão das circunstâncias do crime, «diante da quantidade e diversidade de drogas apreendidas, algumas de alto poder viciantes» e consequências, pois «ainda que não se tenha, concretamente, demonstrado uma vítima em especial, é fato incontroverso que o delito de tráfico de drogas traz consequências nefastas na sociedade como um todo. Notório que outros crimes ocorrem em função do tráfico, assim como roubos, latrocínios, furtos e homicídios, uma verdadeira rede interligada de delitos que têm uma única causa, o tráfico de drogas. Onde o imaginário público é assolado por chacinas, execuções e confrontos entre quadrilhas de traficantes como ilustrações dramáticas que parecem crescentemente tomar conta do cotidiano dos grandes centros urbanos brasileiros, culminando, também, na destruição de famílias, reduzindo usuários a indigentes em condições subumanas". Tocante às circunstâncias, a valoração das diretrizes previstas na Lei 11.343/06, art. 42 deve ser norteada pelos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, não podendo ocasionar indistintamente o aumento da pena-base nas hipóteses envolvendo apreensões de crack ou cocaína, por exemplo. É necessário ter cautela para distinguir se no caso concreto a quantidade e a natureza da droga, analisadas em conjunto, recomendam maior censura ou não extrapolam a razoabilidade do tipo penal. Na hipótese, além do alto poder lesivo dos narcóticos, é necessário considerar que a quantidade é significativa e justifica o acréscimo da pena, pois o réu armazenava "01 (um) pé de maconha; (b) 2 (dois) pacotes de maconha tipo «camarão», pesando, aproximadamente, 80 (oitenta) gramas; (c) 1 (um) saco de maconha, pesando, aproximadamente, 20 (vinte) gramas; (d) 1 (um) frasco contendo um quinto do volume total com Cetamin; (e) 1 (um) tijolo de maconha, pesando, aproximadamente, 200 (duzentos) gramas; (f) 1 (uma) porção de cocaína, pesando, aproximadamente, 28 (vinte e oito) gramas; (g) 1 (um) pacote de ecstasy, pesando, aproximadamente, 50 (cinquenta) gramas; (h) 1 (um) pacote de haxixe, pesando, aproximadamente, 5 (cinco) gramas; (i) 1 (uma) pedra de haxixe, pesando, aproximadamente, 6 (seis) gramas; e (j) 6 (seis) cápsulas de Special Key», extrapolando, portanto, a normalidade esperada para o tipo penal e justificando a necessidade de maior repressão estatal com o recrudescimento da sanção basilar, inclusive em patamar superior a 1/6. De outra banda, os fundamentos invocados para a negativação do vetor «consequências» são insítos ao próprio tipo penal e já previstos quando da cominação da pena mínima e máxima do delito pelo legislador, motivo pelo qual deve ser neutralizado. Com base nesses fundamentos, a pena-base vai redimensionada em 06 anos de reclusão e 600 dias-multa à razão unitária de 1/30 do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, sendo a reprimenda tornada definitiva neste patamar, na ausência de outras causas modificativas. Por outro lado, observa-se que o recurso defensivo com relação ao quantum da fração redutora pela aplicação do privilégio encontra-se prejudicado, uma vez que este foi afastado por ocasião deste julgamento. Assim, quanto ao regime, correta a fixação do inicial fechado, diante da regra do art. 33, §§ 2º e 3º, do CP, considerando, inclusive, a inaplicabilidade do entendimento sumulado no verbete 269 do STJ. Veja-se: «É admissível a adoção do regime prisional semi-aberto aos reincidentes condenados a pena igual ou inferior a quatro anos se favoráveis as circunstâncias judiciais". Logo, tendo a pena sido fixada em 06 (seis) anos de reclusão e observado a presença de uma circunstância judiciail desfavorável, acertada a fixação do regime inicial fechado, eis que em total harmonia com os preceitos legais.
À UNANIMIDADE, DERAM PROVIMENTO AO RECURSO MINISTERIAL E PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DEFENSIVO.
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